Nanotecnologia contra a pandemia

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A Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) iniciou no mês de setembro de 2020 um projeto destinado a desenvolver um medicamento inalatório para o direcionamento de fármacos às vias aéreas inferiores, especialmente os pulmões, um dos principais órgãos atingidos pelo Sars-CoV-2, que é o vírus causador da COVID-19.

O projeto, que é coordenado pela professora Carlota de Oliveira Rangel Yagui do Laboratório de Nanobiotecnologia Farmacêutica da faculdade, escolheu a via de administração por inalação por conta de suas vantagens em relação às vias oral e injetável, principalmente no tratamento de doenças pulmonares. Os principais benefícios dos medicamentos inalatórios são a redução das doses do fármaco e do número de aplicações, a maior aderência ao tratamento e a diminuição de efeitos indesejáveis – ou seja, maior conforto para o paciente.

O projeto é um esforço conjunto de professores e pesquisadores também do Instituto de Física da USP, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), com duas unidades: o Laboratório de Biotecnologia Industrial e o Laboratório de Processos Químicos e Tecnologia de Partículas.
Principais benefícios dos medicamentos inalatórios são a redução das doses do fármaco e do número de aplicações, a maior aderência ao tratamento e a diminuição de efeitos indesejáveis
Principais benefícios dos medicamentos inalatórios são a redução das doses do fármaco e do número de aplicações, a maior aderência ao tratamento e a diminuição de efeitos indesejáveis
As empresas DFE-Pharma, IMCD e Lipid/Lipoid são outros parceiros que apoiam o projeto por meio de suporte técnico-científico e do fornecimento de matérias-primas farmacêuticas.

INALAÇÃO COMO OPÇÃO – A aplicação do medicamento seria por meio de um inalador em formato parecido ao de uma ‘bombinha de asma’ e já disponível no mercado para o tratamento de uma série de doenças respiratórias. "As formulações, que são pós inalatórios administrados por via oral, são geralmente cápsulas que são colocadas neste inalador. O paciente pressiona um gatilho, a cápsula se rompe e o paciente inspira o conteúdo, que é encaminhado diretamente ao pulmão", afirma Yagui.

"Existem alguns medicamentos inalatórios no mercado. Nossa proposta é de uma formulação em pó seco para a inalação através da boca", completa Valker Araújo Feitosa, pós-doutor no Laboratório de Nanobiotecnologia e pesquisador do Laboratório de Biotecnologia Industrial do IPT. O desafio, segundo ele, é desenvolver um processo de secagem com controle do tamanho de partícula do pó inalatório, de modo que ele percorra toda a extensão das vias respiratórias até chegar aos pulmões.

A grande inovação proposta no projeto, explica ele, é uma formulação baseada em micropartículas poliméricas funcionalizadas, conferindo assim uma maior afinidade pelo tecido pulmonar e a entrega localizada do fármaco.

AZITROMICINA – O grupo de trabalho selecionou a azitromicina para a execução dos ensaios. "Estamos atentos às pesquisas que estão sendo feitas com diferentes possíveis fármacos: uma das estratégias adotadas hoje é o reposicionamento, ou seja, utilizar fármacos já disponíveis na terapia de alguma doença. Vimos esta tentativa com a cloroquina, que não funcionou, e existem outras moléculas que estão sendo investigadas em testes clínicos", explica Yagui.

A escolha pela azitromicina, completa a professora, foi feita em razão de o antibiótico já estar sendo utilizado em pacientes com Covid-19 e ser um fármaco de primeira escolha para o tratamento, por exemplo, de pneumonia adquirida na comunidade (PAC), doença de caráter bacteriano que atinge o parênquima pulmonar e é adquirida fora de hospitais ou instalações de cuidados prolongados. "Além disso, estudos mostram que a azitromicina tem uma função imunomoduladora, ou seja, ativa o sistema imunológico no caso de doenças obstrutivas das vias respiratórias", completa ela.

Outro objetivo do projeto é o desenvolvimento de uma plataforma tecnológica em que seja possível encapsular fármacos promissores não apenas para o tratamento da Covid-19, mas também para outras infecções virais e microbianas que afetam as vias respiratórias, como a asma e a Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, mais conhecida como DPOC.

Os pesquisadores estão dedicados nesta fase inicial do projeto no desenvolvimento da formulação e do processo de secagem, ou seja, buscando excipientes, polímeros e matérias-primas que possam ser combinados e formar uma estrutura capaz de carrear os fármacos até os pulmões. "Falar em prazo é complicado no âmbito farmacêutico por conta do tempo de P&D e de produção de novos medicamentos. A expectativa é que no futuro possamos transferir a tecnologia para uma indústria farmacêutica interessada na realização de testes clínicos e na fabricação do medicamento", completa Feitosa. O projeto deve ser finalizado em julho de 2023.

O estudo foi um dos selecionados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) no âmbito do "Programa Estratégico Emergencial de Combate a Surtos, Endemias, Epidemias e Pandemias – Fármacos e Imunologia”, com recursos financeiros e duas bolsas: uma para a doutoranda Alisson Madrid (Programa de Pós-graduação em Tecnologia Bioquímico-Farmacêutica – FCF/USP), e a outra de pós-doutorado para Feitosa. O projeto também conta com financiamento da Fundação de Apoio ao IPT (Fipt) no formato de projeto de capacitação.

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