Quase dois meses depois de ser lançado, o game Pokémon Go, para smartphones e tablets, ainda é uma febre mundial entre pessoas de todas as idades. Lançado em julho no Japão e gradativamente em outros países do mundo – chegando ao Brasil em agosto –, o jogo tem como principal atrativo a possibilidade de sobrepor elementos virtuais à realidade. Em outras palavras, pela tela do celular o jogador pode ver seres e coisas virtuais em lugares reais, como a rua de casa ou o escritório. Para isso emprega uma tecnologia chamada realidade aumentada que, contrariando o senso comum, não é nova.
Segundo Marcelo Russo, pesquisador da Seção de Soluções de Software e Sistemas para Engenharia do IPT, essa tecnologia surgiu na década de 1970. “Ela apareceu naquela época e está evoluindo desde então. A realidade aumentada permite aplicações em diversas áreas, inclusive na área de games como é o caso de Pokémon Go”, explica ele.
Pokemon Go foi lançado no Brasil em agosto, durante as Olimpíadas do Rio de Janeiro
A tecnologia da realidade aumentada (augmented-reality) consiste, principalmente, na possibilidade de usar o espaço físico real para sobrepor elementos virtuais. Para isso, geralmente se usa o ambiente da realidade captado por algum tipo de sensor (geralmente uma câmera) e, em um segundo passo, os objetos virtuais são colocados nesse contexto por meio de hardware ou software .
Os primeiros ensaios feitos por meio da tecnologia aconteceram nos Estados Unidos e tinham como base equipamentos instalados sobre os olhos das pessoas. Em 1968, o cientista da computação Ivan Sutherland criou um aparelho chamado The Sword of Damocles, cujo objetivo era ajudar seu aluno, Bob Sproull, em estudo sobre o aumento da realidade. Sutherland produziu um dispositivo grande e desengonçado em que duas viseiras semelhantes às usadas em câmeras de filmagem eram colocadas sobre os olhos de Sproull. Dependendo de sua posição, era possível ver que a sala estava repleta de elementos virtuais.
De lá para cá, o desenvolvimento dessa tecnologia se deu muito por causa do investimento bélico nos Estados Unidos. Treinamentos de soldados em diversas ações – guiando caças ou em locais de conflito aberto – foram feitos com a ajuda da realidade aumentada. Nos anos 1990, no entanto, o entretenimento percebeu nessa possibilidade uma forma de fazer dinheiro. A partir de 1995, empresas como a japonesa Nintendo passaram a financiar projetos que envolviam jogos em realidade aumentada. Recentemente, o Google tentou produzir óculos cuja funcionalidade principal seria permitir ao usuário ver mapas, informações sobre lugares e acontecimentos em tempo real. Apesar do estrondo do ponto de vista tecnológico, o aparelho não teve apelo popular.
“É claro que interagir duas tecnologias, como os dados do GoogleMaps e a realidade aumentada, não é algo tão simples, mas muitas aplicações já faziam uso da realidade aumentada”, explica Russo.
Segundo Filipe Cunha, pesquisador também da seção do IPT, o Pokémon Go só se vale realmente da tecnologia de realidade aumentada no momento de ‘capturar’ os bichinhos. Enquanto o jogador está com seu celular procurando os seres, não está fazendo nada mais do que interagir com o aplicativo. É apenas quando eles surgem que a tecnologia da realidade aumentada está em pleno funcionamento. “Assim que enxerga um Pokémon, o jogador precisa ‘sacar uma pokebola’ e jogar sobre ele. A aplicação da realidade aumentada no jogo consiste na fusão da imagem real projetada pela câmera e as animações de Pokémons, dando a ‘real’ impressão de que os bichinhos realmente estão por perto”, explica.
SUCESSO DO POKÉMON GO – Basicamente, a resposta para essa pergunta está no apelo comercial. Como o jogo utilizou a história de um dos desenhos japoneses mais famosos no mundo – a do treinador de Pokémons Ash Ketchum, que vive em um mundo repleto de seres com poderes e que podem ser capturados por outros treinadores –, não foi difícil convencer uma multidão de jogadores espalhados no planeta a ser, assim como Ash, dono de alguns Pokémons. “O jogo fez uso de toda uma geração que assistiu ao desenho quando ele foi lançado. O apelo comercial já era imenso. É como se você trouxesse a magia da série para o mundo real”, analisa Russo.
A dificuldade de fato consistiu em mapear os diversos lugares onde o game seria lançado. No caso do Brasil, a Niantic, empresa que produziu o jogo em parceria com a Nintendo, usou os dados que os próprios jogadores enviaram para a empresa por meio de outro aplicativo, o Ingress, lançado em 2012. Neste, os usuários andavam pela cidade instalando portais mágicos nas ruas, praças e parques. Como seus jogadores brasileiros eram fiéis, as empresas conseguiram usar os mesmos mapas do Ingress pra lançar o Pokémon Go no País.
Para o futuro, Cunha e Russo são enfáticos: “o céu é o limite”. Segundo eles, a tecnologia ainda não foi usada em todas as suas possibilidades e nos diversos campos de atuação, como a medicina. “Imagino que, quando os médicos conseguirem desfrutar ao máximo da tecnologia, vão conseguir simular cirurgias complexas antes de sua realização”, finaliza Cunha.