Oportunidades para inovação

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Um grupo de 150 pesquisadores e empresários esteve reunido na segunda-feira, 16 de julho, no novo núcleo de bionanomanufatura do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) para conhecer as competências nas áreas de biotecnologia, nanotecnologia, microtecnologia e metrologia de ultraprecisão e também o sistema de financiamento para projetos inovadores, promovido pela Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii). O diretor-presidente do IPT, João Fernando Gomes de Oliveira, abriu o ‘Workshop de Bionanomanufatura: Oportunidades para Inovação Tecnológica’ lembrando que o novo centro do IPT é parte do programa de modernização do Instituto, com investimentos do Governo do Estado de São Paulo em infraestrutura e recursos humanos.

João Fernando Gomes de Oliveira: "É hora de as empresas que têm perspectivas de mercado, com aplicações da bionanotecnologia, juntarem-se a nós em um esforço capaz de ajudar a reverter as dificuldades vividas em alguns setores”
João Fernando Gomes de Oliveira: "É hora de as empresas que têm perspectivas de mercado, com aplicações da bionanotecnologia, juntarem-se a nós em um esforço capaz de ajudar a reverter as dificuldades vividas em alguns setores”
“As novas instalações são um marco nesta área no Brasil e internacionalmente. Recebemos no mês de abril a visita de Ulrich Buller, vice-presidente de planejamento de pesquisas do Instituto Fraunhofer, na Alemanha, que ficou impressionado com o peso da iniciativa”, afirmou Gomes de Oliveira. Segundo ele, o ponto de partida para a construção do centro foram oportunidades de negócios vislumbradas a partir de problemas industriais. Com base nos business plans de inovação das empresas, o IPT desenhou fluxos de atividades para atender demandas pré-pesquisadas e, a partir daí, saber quais seriam as competências em pessoal e infraestrutura necessárias para o projeto de um centro multidisciplinar.

Qual o interesse em fazer bionanomanufatura? Para responder a esta pergunta, a diretora-adjunta do Centre Rapsodee na França, Maria Inês Ré, mostrou que áreas como biotecnologia e microtecnologia são tecnologias-chave para o desenvolvimento das indústrias frente a exigências estabelecidas para o desenvolvimento sustentável, isto é, a capacidade de gerar produtos inovadores usando processos e matérias-primas e garantir que gerações futuras possam também dispor de tais recursos. “A indústria hoje enfrenta o desafio de reduzir o uso da energia, procurar matérias-primas adequadas, de preferência renováveis, e preservar o meio ambiente, sem deixar de lado a preocupação com a competitividade”, afirmou ela.

Maria Inês trouxe à apresentação um quadro geral de biotecnologia, nanotecnologia e miniaturização. A biotecnologia é uma tendência mundial no mercado farmacêutico, assim como no setor de biocombustíveis, e demanda o uso de conhecimentos multidisciplinares e de uma infraestrutura para estudos de processos em laboratório; já a nanotecnologia é uma área presente há tempos na história da humanidade, mas que sofreu uma mudança nas duas últimas décadas e passou a ter foco na concepção e na funcionalização dos produtos. “Um impacto grande está acontecendo na área de bionanotecnologia e vemos uma evolução fenomenal na área da saúde. É a medicina com novos conceitos e ferramentas, como nanocarreadores para transporte de medicamentos e microdispositivos como cápsulas para a execução de diagnósticos como endoscopias”, afirmou ela.

NOVAS COMPETÊNCIAS – O responsável pelo Laboratório de Processos Químicos e Tecnologia de Partículas do IPT, Wagner Aldeia, explicou as capacitações e a atuação das equipes do Instituto em nanotecnologia. A infraestrutura do centro de bionanomanufatura estará disponível tanto para a geração quanto para a funcionalização de materiais inorgânicos, como a sílica e a prata para uso biológico, e materiais orgânicos como os nanocarreadores para a indústria farmacêutica. Equipamento de spray dryer para a conversão de soluções em materiais particulados secos, homogeneizador de alta pressão, reatores automatizados e sistema de eletrofiação para produção de nanofibras são alguns dos recursos presentes na nova unidade.

As linhas de atuação do laboratório estão baseadas na adaptação de processos às necessidades da pesquisa. Aldeia exemplificou com uma pesquisa já realizada no IPT e voltada ao estudo de um agente empregado na fabricação de protetores solares, composto de materiais orgânicos e inorgânicos associados em uma única estrutura; estes materiais, segundo o pesquisador, podem ser também usados em estruturas de embalagens, por exemplo, para a proteção contra radiações em vasilhames.

Antibióticos, bebidas e combustíveis foram alguns exemplos de produtos biotecnológicos presentes no dia a dia mencionados durante a apresentação de Maria Filomena Rodrigues, responsável pelo Centro de Tecnologia de Processos e Produtos do IPT. A atuação do Instituto pode colaborar para resolver gargalos em diversas etapas do processo industrial, explicou a pesquisadora, incluindo desde o isolamento e a seleção de micro-organismos, a modificação genética, as condições de cultivo, a operação de biorreatores e o escalonamento. A infraestrutura disponível para as pesquisas em biotecnologia permitirá ao centro trabalhar com a manipulação de micro-organismos das classes 1 e 2, bioprospecção, testes de citotoxicidade, biorreatores com capacidade de 0,7 L a 100 L, monitoramento de biodegradação e caracterização de biomoléculas, entre outros.

Os principais recursos em metrologia de ultraprecisão foram detalhados no workshop pelo diretor do Centro de Metrologia Mecânica e Elétrica, Crhistian Raffaelo Baldo. Embora a metrologia seja parte do dia a dia, as atividades de metrologia multissensor tridimensional são incipientes no Brasil e têm uma gama de aplicações que vai desde o setor automotivo até o biomédico. O centro de bionanomanufatura do IPT contará com uma área de micrometrologia tridimensional e metrotomografia que prestarão serviços e darão apoio às pesquisas de diversas áreas do Instituto, enquanto a área de microusinagem funcionará principalmente como suporte ao laboratório de microfluídica para a fabricação de dispositivos e componentes.

Dois dos novos equipamentos foram destaques na apresentação de Baldo: a máquina de medição por coordenadas de alta exatidão, usada para microgeometrias com apalpadores de fibra óptica para medição em 2D e 3D, e o sistema multissensor de metrotomografia para detecção e análise de defeitos em peças e mecanismos complexos, fabricados em materiais metálicos e não-metálicos. “Qualquer amostra que possa ser projetada no detector e ‘atravessada’ pelos raios-X por completo em todas as direções é um potencial uso da máquina. Conseguir examinar uma peça por dentro sem a sua destruição é uma grande vantagem da tomografia. A metrologia multissensor tridimensional oferece soluções para medição de componentes de dimensões milimétricas, geometrias micrométricas e incertezas submicrométricas”, afirmou Baldo.

Criada com a ideia de fazer interação não somente com a área de biologia, mas também de física, química e ciência dos materiais, a microtecnologia foi tema da apresentação da engenheira mecânica Luciana Wasnievski Ramos. O objetivo da implantação da área no novo centro é auxiliar as indústrias na fabricação de componentes e sistemas em escala micrométrica, em competências já presentes ou em implantação no IPT, como processos LTCC (Low Temperature Co-fired Ceramics), de microusinagem e de microfabricação em sala limpa, que podem ser combinados para diversas aplicações.

Luciana trouxe exemplos de aplicações já estudadas no IPT, como um microrreator em LTCC para biodiesel, um trocador de calor compacto também em LTCC e a geração de emulsões em microdispositivos em vidro, que têm agora à disposição dos pesquisadores uma nova infraestrutura composta de equipamentos para processos de deposição física por vapor (PVD) de filmes finos, fotolitografia e microscopia eletrônica de varredura. “Grande parte das pesquisas em microtecnologia requerem ações multidisciplinares, o que abre caminho para estabelecer parcerias entre os diversos laboratórios do IPT e com clientes externos para atingir novas possibilidades de atuação”, completou ela.

VISÃO DOS EMPRESÁRIOS – Pedro Wongtschowski, presidente do Grupo Ultra, presidiu uma mesa-redonda de empresários ao final da primeira rodada do workshop no Instituto. Ele enfatizou a transformação pela qual passou o Instituto nos últimos anos, modernizando-se para retomar suas raízes históricas de atendimento à indústria nacional. “Houve mesmo uma transformação ideológica extremamente positiva, colocando competência técnica e potencialidade de uso de suas instalações de ponta por empresas dos mais diversos setores e portes. Vi pesquisadores do IPT falando em ‘agregar valor’, na linguagem do cliente, mostrando que estão prontos para participar ativamente do processo de inovação”.

Pedro Wongtschowski (ao microfone), presidente do Grupo Ultra, presidiu mesa-redonda de empresários e pesquisadores no workshop: "Pesquisadores do IPT estão prontos para participar ativamente do processo de inovação"
Pedro Wongtschowski (ao microfone), presidente do Grupo Ultra, presidiu mesa-redonda de empresários e pesquisadores no workshop: "Pesquisadores do IPT estão prontos para participar ativamente do processo de inovação"
Gina V. Sebastian, do Cenpes/Petrobras, destacou o potencial de aplicações das ferramentas tecnológicas de biossensores e nanopartículas na prospecção de reservas de petróleo e gás em grandes profundidades, como no caso do pré-sal. Ela apontou possibilidades de recuperação de óleo remanescente nos reservatórios, da ordem de 50% do volume estimado, utilizando a biotecnologia. “O acesso a reservas do pré-sal é complexo: o desenvolvimento de microcápsulas, por exemplo, poderá liberar microorganismos capazes de retirar óleo diretamente nos locais em alto mar. Biorrefinaria é um conceito a ser desenvolvido no Brasil: somos competitivos em biocombustíveis, biodiesel, etanol e álcool de microalgas, entre outros. Há um grande potencial para aplicações da bio e nanotecnologia na indústria do petróleo”.

Carla M. B. Freitas, da Vallée, foi enfática ao afirmar que há um IPT antes e outro depois de entrar em funcionamento a nova estrutura de pesquisa em bionanomanufatura. “Existe a possibilidade real de transformar conhecimento científico em potencial de negócios para o País. A multidisciplinaridade aponta um caminho, pois não temos atuação independente de maneira isolada. Atuar em conjunto com o IPT pode nos ajudar a ter mais competitividade e produtividade. Estamos no ramo da indústria farmacêutica veterinária, em que a biotecnologia é da maior relevância. A liberação controlada de princípios ativos, por exemplo, tem grande potencial em nossa área, assim com a microtecnologia para miniaturizar plantas-piloto com menores custos e ganhos de produtividade. O IPT tem muito a colaborar na produção e no controle de qualidade de novos produtos”.

Jadir Nunes, da Stiefel, afirmou que o Brasil é país-chave no mundo para a indústria farmacêutica dermocosmética, especialmente em função do foco do setor nos mercados emergentes. “Esse é um setor muito competitivo, em que produtos inovadores são determinantes para o sucesso. Neste contexto, tanto para empresas locais quanto globais com infraestrutura regional, a parceria com o IPT é fundamental. Nano e biotecnologia têm fortes possibilidades de aplicação em cosméticos antienvelhecimento, para hidratação e proteção solar que, além da estética, é uma questão de saúde pública. A Europa já começa a fabricar produtos nanoestruturados para proteção solar e a nova estrutura do IPT poderá dar apoio à indústria local não só no desenvolvimento, mas na caracterização de produtos nanoestruturados. Há espaço para empresas dos mais diversos tamanhos e áreas de atividade”.



Edson Couto, da Basf, afirmou que a empresa tem diversas iniciativas e muitas dúvidas em nanotecnologia. “No Brasil poderíamos andar mais rápido, por exemplo, na área de materiais renováveis. Na química precisamos identificar os reais benefícios da nano, como materiais com possível maior reatividade e condutividade. O mimetismo (imitação da natureza) como no caso da folha de lótus, que se suja pouco, tem muito a ensinar ao setor de tintas sobre a poluição intensa de grandes cidades, mostrando que a propriedade hidrofílica pode ser mais útil para diminuir a retenção de sujeira do que a impermeabilização. Poderíamos desenvolver adesivos inspirados nas patas da lagartixa, capazes de grudar muitas vezes. Pigmentos com maior poder de cobertura, polímeros com maior capacidade ligante e capacidade de produzir resinas com a mobilidade das microplantas. Há um potencial imenso, muito maior do que já foi feito até aqui. Também precisamos de um centro de pesquisas como o IPT para remover barreiras de comunicação sobre aplicações seguras de nanopartículas”.

A pesquisadora Maria Inês colocou aos participantes que a Europa mobilizou-se há cerca de 15 anos para estudar aplicações da microtecnologia. ”Inicialmente foram as universidades, depois vieram empresas como a Merck que pagaram para ver. Hoje as usinas são uma realidade por lá. Há poucos fornecedores de microdispositivos e grandes mercados potenciais. Ainda hoje, mesmo na Europa, existem poucos centros com a excelência apresentada pelo IPT, que está antecipando uma necessidade que deverá ‘explodir’ por aqui lá pelo ano de 2030. Com uma diferença importante: enquanto os centros europeus são especializados em determinado material, o IPT abre uma estrutura flexível, capaz de atuar com diversos materiais.” Complementando o raciocínio de Maria Inês, Wongtschowski lembrou as células combustíveis e apontou os setores de locomoção e geração de energia como os de maior potencial para microtecnologia.

Gomes de Oliveira afirmou que a estratégia em bionanomanufatura é beneficiar diversos setores com forte potencial como petróleo e gás, mineração, naval, construção civil, agronegócio, fármacos e cosméticos. “Alguns setores como o eletroeletrônico e o têxtil enfrentam hoje o risco da desindustrialização, Para haver inovação, é preciso haver empresas vivas. É hora de as empresas que têm perspectivas de mercado, com aplicações da bionanotecnologia, juntarem-se a nós em um esforço virtuoso capaz de ajudar a reverter o quadro de dificuldades vividas em alguns setores.”

EMBRAPII – Na parte da tarde do evento, foram apresentados aos participantes os critérios de financiamento da Embrapii para apoio aos projetos inovadores. Nessa fase inicial de gestão da nova empresa, que também é chamada de fase piloto, serão apoiados projetos de áreas específicas em cada um dos três parceiros do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) que vão operacionalizar a política de atuação definida para a Embrapii.

O IPT concentra os projetos de biotecnologia, nanotecnologia, microtecnologia e micrometrologia; o Instituto Nacional de Tecnologia (INT), do Rio, ficou com as áreas de energia e saúde; e o SENAI Bahia, com automação e manufatura.

“O dinheiro da Embrapii pode cobrir até 90% do projeto, dependendo de sua prioridade”, afirmou Flavia Motta, da Coordenadoria de Planejamento e Negócios do IPT, explicando que o recurso tem um caráter de fomento, ou seja, não é retornável. As fases de tramitação do projeto no processo de seleção são a submissão propriamente dita, a definição dos aportes e a contratação efetiva. Esta última etapa deve ser cumprida no prazo médio de um mês.

“O que vai definir o valor aportado serão as características do projeto”, disse Flavia. A submissão do projeto é feita por um pesquisador do IPT. O critério para decidir pelo valor do aporte é quanto ao potencial de geração de conhecimento da ideia. Os projetos serão avaliados quanto ao desafio tecnológico que impõem e ainda quanto ao valor demandado.

Como a estrutura de gestão de projetos é tripartite, a parte financeira dos recursos é da Emprapii e a parte econômica – que envolve a infraestrutura, equipamentos e o trabalho de pesquisadores – é do IPT ou de um dos outros dos parceiros, dependendo da área envolvida no escopo do trabalho. Há ainda a contrapartida da empresa, que em última instância pode ser feita por meio de financiamento retornável. Flavia lembra que existe ainda a possibilidade de interação com outros modelos de apoio à inovação, como a lei de Informática e a Lei do Bem, também criada pelo governo federal para apoiar a inovação.

“Entramos na Embrapii com uma ação específica em bionanomanufatura, porque este tipo de iniciativa é muito similar às atividades exercidas pelo Instituto Fraunhofer na Alemanha. É um modelo novo dentro do IPT e, desta forma, somente os projetos de pesquisa na área serão contemplados. Para alcançar este objetivo, investimos em pessoal qualificado, laboratórios e infraestrutura e estamos prontos a atender às demandas industriais”, afirmou Gomes de Oliveira. “É importante que haja agilidade na contratação porque o IPT já tem R$ 30 milhões da Embrapii em uma conta vinculada”, completou ele, destacando que esse dinheiro deverá ser destinado aos projetos até junho de 2013, sob o risco de ter ser devolvido para o MCTI se não for usado.

O secretário de desenvolvimento tecnológico e inovação do MCTI, Alvaro Toubes Prata, disse que é importante as empresas se mobilizarem para encaminhar suas demandas à Embrapii. “O governo federal e os parceiros da Embrapii estão assumindo riscos no desenvolvimento de P&D e o desafio é levar a resultados transformadores”, disse aos cerca de 100 empresários e 50 pesquisadores reunidos no auditório do novo núcleo de bionanomanufatura do IPT.

O representante do MCTI também afirmou que o momento histórico do País impõe que se invista do desenvolvimento tecnológico, uma vez que o Brasil vem desenvolvendo sua área científica há 60 anos e atualmente é considerada a 13ª potência científica no mundo, ainda que isso possa inspirar uma contradição, visto que o País não resolveu seus problemas com educação. “O desafio agora é aplicar a ciência no setor industrial”, disse.

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