Patrimônio histórico

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Um efeito decorativo na superfície do tecido de um vestido confeccionado entre o final do século XIX e o início do século XX foi objeto de estudos no Centro de Têxteis Técnicos e Manufaturados (Cetim) do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). O Museu Paulista da Universidade de São Paulo solicitou ao IPT a elaboração de um parecer técnico investigativo sobre a tecnologia empregada na produção do efeito em alto-relevo de traje histórico, que pertenceu à Anna Carolina de Melo Oliveira de Arruda Botelho, a Condessa do Pinhal.

Os ensaios de caracterização no IPT foram executados dentro do Projeto Replicar, que foi concebido após uma solicitação feita por descendentes da condessa para a cessão de um dos vestidos pertencentes à coleção do museu. A intenção era a sua exibição em uma exposição permanente nas instalações da família, a Fazenda do Pinhal na cidade de São Carlos, que foi declarada patrimônio histórico e artístico nacional pelo Governo Federal em 1987.
Pequenas amostras do tecido do vestido da Condessa do Pinhal foram fornecidas pelo Museu Paulista para análise no IPT
Pequenas amostras do tecido do vestido da Condessa do Pinhal foram fornecidas pelo Museu Paulista para análise no IPT
Em razão da impossibilidade de emprestar o vestido, o projeto foi criado com o objetivo de confecção de uma réplica.

Com duração de 15 meses, o projeto teve duas etapas principais. “A primeira compreendeu a pesquisa histórica, a caracterização dos materiais e das técnicas, bem como toda a modelagem, identificando as dificuldades para a confecção de um protótipo piloto de estudo em algodão branco”, explica Teresa Cristina Toledo de Paula, responsável pela concepção, coordenação científica e pesquisa do projeto. A participação do IPT começou efetivamente na segunda etapa, quando houve uma dificuldade na reprodução do efeito do tecido do traje e a equipe do museu procurou o Instituto para entender onde estava o segredo tecnológico do processo.

Pequenas amostras do tecido foram fornecidas pelo Museu Paulista para análise no IPT. A oferta reduzida de material deveu-se ao fato de o vestido ser patrimônio histórico de manuseio restrito e sujeito a regras para avaliação. Os itens usados para as análises foram amostras da fita, do bordado da blusa, do tecido da saia e do bordado do tecido da saia.

ENSAIOS NÃO-DESTRUTIVOS – As duas partes (blusa e saia) do vestido da Condessa do Pinhal são independentes, fabricadas em material têxtil na cor preta e foram parcialmente costuradas manual e automaticamente. Para as avaliações do efeito do tecido da indumentária e do bordado, a saia ficou disponível para registros fotográficos e micrográficos em uma visita técnica assistida ao IPT.

Uma série de análises qualitativas para a identificação do material foi realizada no Laboratório de Têxteis e Confecções do IPT. Ensaios destrutivos foram descartados, dada a disponibilidade reduzida do material, e a opção recaiu pela identificação das fibras em microscópios ópticos e no recém-adquirido microscópio eletrônico de varredura (MEV-FEG). Dois corpos de prova foram retirados de cada item, um para análise da seção longitudinal e outro da seção transversal. Para a fita da blusa, um aumento microscópico de 2.000 vezes foi empregado na produção de imagens; de 500 e 2.000 vezes no bordado da blusa; de 1.500 a 8.000 vezes no tecido da saia, e de 2.500 vezes no bordado do tecido da saia.

Os ensaios qualitativos incluíram a determinação do diâmetro e do comprimento das fibras para efetuar uma classificação da qualidade do material usado para a reprodução do vestido, incluindo a busca da composição percentual dos materiais têxteis que compunham os tecidos. Em seguida, os pesquisadores procederam à identificação do processo de produção para determinar se o fio era torcido ou com uma estrutura de fibras paralelas, por exemplo. “Era preciso especificar a fibra para relacionar suas propriedades e como o efeito decorativo havia sido gerado e permanece até hoje”, explica Richard Pahl, diretor do Centro de Têxteis Técnicos e Manufaturados (Cetim) do IPT.


CONCLUSÃO – Nas avaliações dos componentes usados na construção da indumentária, os pesquisadores do laboratório constataram que a fita da blusa e o bordado da blusa são constituídos por fibras de seda, enquanto o tecido da saia é formado por fibras de lã e o bordado do tecido da saia apresentou duas possibilidades, seda ou cupramônio (fibra artificial produzida através de uma celulose regenerada do algodão) – seria necessária uma maior quantidade de material para outras técnicas analíticas, o que não foi possível. Os bordados têm dimensões semelhantes e estão distribuídos de modo uniforme pelo tecido, em uma conformação manual denominada “ponto cheio”.

Da regularidade do efeito observado no tecido da saia, em formas ovais repetidas e próximas compondo um padrão, os pesquisadores constataram que ele foi obtido por tear especial e provocado por distorções dos fios da trama do tecido. Foram usados dados de uma investigação histórica feita pelos pesquisadores do IPT sobre as técnicas disponíveis entre o final do século XIX e o início do século XX para a produção de efeitos em tecidos, assim como a avaliação da viabilidade tecnológica dos sistemas usados.

“Fizemos um levantamento de publicações da época e também de textos disponíveis na internet. Buscamos informações sobre a execução dos tingimentos na época, a produção dos efeitos e o maquinário, inclusive os registros de patentes que mostravam os procedimentos para a produção do efeito”, afirma Pahl. A equipe de pesquisadores do laboratório concluiu que houve a aplicação da técnica conhecida como Moiré, que é um efeito visual no tecido que permite mudanças na intensidade do brilho, especialmente em seda, viscose ou fibras sintéticas. “O Moiré não é necessariamente uma técnica da área têxtil e é muito usado na indústria gráfica. Neste caso, o efeito exigiu a construção ou adaptação de um equipamento na área têxtil destinado à sua reprodução em tecidos”, afirma Pahl.

O parecer técnico elaborado pelo IPT também reconstituiu o fluxo produtivo para a construção do tecido da saia com efeito. O ciclo de seis etapas começaria pela fiação e continuaria com o tingimento, a tecelagem, a produção do efeito, a fixação e o bordado. “O objetivo inicial era determinar como o efeito foi gerado, mas complementamos a informação com dados sobre as fibras usadas e a sequência provável da operação”, completa Pahl.

Para mais informações sobre o projeto, clique aqui.

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